domingo, 06 de julho de 2025

Morre o “Clóvão da Peixaria” aos 72 anos

Publicado em 22 mar 2021 - 18:12:26

           

José Clóvis Corrêa de Moraes não resistiu às complicações de saúde, após ser contaminado pelo Coronavirus

 

Hernani Corrêa

 

Perdemos um irmão muito querido: o Clóvis, ou “Clóvão da Peixaria”. Por nós e por muitos que não temos nem noção.
Só na hora em que fui no cemitério autorizar o sepultamento dele no mesmo túmulo dos nossos pais, dois funcionários me disseram que o conheciam, que já tinham trabalhado com ele, ou parente seu trabalhou.
Por aí temos noção do quanto ele ajudou muitos pelo seu espírito empreendedor e de muita força de vontade e coração generoso. “O que era dele, era de todos e dividia com todo o mundo”.
Recebi centenas de mensagens via redes sociais, muitos o conheciam, conviveram com ele e nem sabiam que era meu irmão. Foi o mais velho dos homens de uma família de 3 filhos e 6 filhas. O primeiro a falecer.

Em Bernardino de Campos, onde nasceu, já amante de esportes, foi campeão de futebol de salão

Quando éramos crianças, da segunda e terceira geração de filhos, ajudou nossos pais a nos sustentar carregando e descarregando vagões de trem com sacos de até 60 kilos nas costas em Bernardino.
Já em Ourinhos foi destaque no tênis de mesa no Clube Atlético Ourinhense, onde foi campeão por diversas vezes. Sempre praticou esportes como futebol de salão. Era um exímio nadador e não tinha medo de atravessar rios.

Na fase áurea do Clube Atlético Ourinhense, foi campeão de tênis de mesa diversas vezes

Quando jovem, foi funcionário do Estado, no setor de combates à esquistossomose. Ali no fim da Rua Antônio Carlos Mori, onde também funcionava a SUCEN – Superintendência de Combate a Endemias.
Nosso pai, Sr. Nelson, também trabalhava ali e acabou se aposentando como funcionário público. “Clóvão” não parou por aí.
Não aguentou ficar parado, tinha pouco serviço. Por diversas vezes vi ele num quartinho nos fundos deitado, porque não tinha trabalho, não tinha o que fazer.

Ainda jovem, já apaixonado pela água, sempre se destacou como exímio nadador e não temia rios e mares

Não contente, foi aprender a trabalhar de pedreiro sozinho, fazendo o muro que dividia sua casa com um vizinho no Jardim Paulista. O vizinho tinha visto ele fazer uma simples calçada primeira casa onde morou, após casado com minha cunhada Iracema, falecida há poucos anos.

A primeira casa onde morou, já casado com Iracema, no Jardim Paulista

E tornou-se um dos maiores construtores de nossa cidade. O Laticínio do Pedrão Queijeiro e aquela enorme casa na Vila Kennedy foram obras sob sua responsabilidade. Além de inúmeras outras mansões da cidade.

Olhar pensativo, observador, mas sempre atento a tudo à sua volta

Irrequieto, empreendedor, instalou a primeira banca de jornais na esquina da Santa Casa em meados da década de 70. Banca que ele fez na garagem da casa do meu pai, quando morávamos na Vila Boa Esperança.
Ali, eu tive meu primeiro contato com um jornal, quando fui ver a banca pronta e imediatamente, ele e sua esposa me deram jornal pra vender na rua. E fui.

Com a esposa Iracema, os filhos Marcelo, Márcia e o caçula Fernando

Depois, com uma Kombi, a famosa “Comboza”, como era chamada, começou a vender peixes, fazer feiras fora de Ourinhos até se tornar a melhor peixaria e o maior distribuidor de nossa região: a famosa e tradicional Peixaria de Clóvis e a 3M Pescados.

A “Comboza”, a primeira Kombi que Clóvis começou a vender peixes

Caminhões e caminhões saiam lotados todos os dias, puxando trailers com 30, 40 pessoas, equipamentos, barracas, fogões, freezers, etc. Para ele, era sempre festa.
Feirões eram feitos em Assis, Santa Cruz, Presidente Prudente, Marilia, Bauru, São José do Rio Preto e outras. Quem não se lembra de suas chamadas nas Rádios? “Um caminhão de peixes a preço do Ceasa?”

Nas viagens para as praias no final do ano, fazia questão de levar toda a família e muitos amigos

E formavam se filas enormes na Praça Mello Peixoto e outras da região. Tinha dezenas de funcionários que sustentavam suas famílias daquele negócio.
Fez fortuna, muitos amigos quando começou a frequentar rodeios por todo esse Estado. Não saía do camping de Ipaussu onde fez novos amigos.
Quando íamos para praia em família, em mais de 40 pessoas, ele não tinha noção do perigo. Viajávamos todos dentro daquele caminhão furgão, apertados, junto a freezers, engradados de bebidas, churrasqueiras, todos sentados ou deitados em cima de colchões.

Muitos amigos acompanharam sua trajetória e, ao lado do Clóvão, não tinha tristeza

Mesmo depois de fechar a empresa, não abriu mão de morar num barracão simples, não acabado, ao lado da casa dos pais, onde foi um dos últimos depósitos de sua peixaria no Parque Minas Gerais.
Ali, ficava o dia inteiro, com seus cachorros, sentado numa cadeira, sempre sem camisa pois sentia muito calor. E cumprimentava um a um que passava em sua calçada ou do outro lado da rua.
Nós temíamos por ele, quando apareceu a Covid. Tínhamos consciência de sua baixa imunidade, das diversas comorbidades como a diabetes altíssima, hipertensão, a obesidade entre outros.

Amante da natureza, Clóvis sempre gostava de estar perto de onde havia água

Fizemos de tudo, durante anos para levarmos para junto de um dos filhos, onde poderia ser melhor cuidado. Já não caminhava mais direito nestes últimos tempos, vivia caindo dentro do quarto.
Mas não teve jeito. Sua teimosia e vontade de permanecer em suas raízes, onde vivia recordando os bons tempos, os antigos amigos, não permitiram que ele saísse dali. E acabou se contaminando de uma maneira fatal.

Sempre brincalhão, divertia os amigos com seu tremendo alto astral

O coronavirus levou o Clóvão da Peixaria, que também tinha seus inúmeros defeitos como nós todos temos. Mas o Clóvão deixou um grande legado: de trabalho, de esforço, de iniciativa, de empreendorismo, de liderança.
E de que a vida pode ser vivida muito bem, de um jeito simples, com o sem dinheiro.

O olhar observador não perdia nada que acontecia ao seu lado

Temos certeza que morreu feliz e este é o nosso consolo. Encerrou sua vida terrestre em suas raízes.
Agora, pela força de nossa fé, também temos certeza que está mais feliz ainda junto da esposa e de nossos pais.

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