sexta, 06 de dezembro de 2024

Afinal, o que querem as mulheres?

Publicado em 21 mar 2017 - 06:05:44

           

(Li Parolini)

Sapatos? Uma blusinha “modernosa”?  Aquele creme superpoderoso ou uma maquiagem fantástica? Mulher, você merece tudo isto e muito mais! Compre agora; porque neste mês todo seu, temos condições exclusivas pra você! Ofertas especiais para quem nem sempre é recatada ou do lar, porém, está sempre bela. 

 As propagandas soam convincentes. Enquanto isto reparo que rostos e corpos de mulheres reinam sobre as capas de revistas; sejam elas femininas ou não. São imagens de mulheres em diversos papéis: de mãe zelosa, profissional competente, esposa dedicada, fêmea sensual e, especialmente, de mulher vaidosa. 

Impossível não pensar que todas essas variações do eu feminino foram construídas com a contribuição dos meios de comunicação, mais intensamente com o surgimento do rádio e da TV, nos idos de 1950. Época em que as mulheres tiveram seus cotidianos alterados, assumindo uma jornada dupla de trabalhos, pois, além de seus afazeres domésticos, como cuidar da casa, marido e filhos, passaram a ser operárias. 

Uma vez assalariada, o mercado elaborou o destino final para a renda financeira da mulher criando produtos “só para ela”: acessórios, moda e decoração, eletrodomésticos e outras utilidades. A mulher “independente” adquiriu a liberdade de ser consumidora. 

De lá para cá, as mídias têm atuado como dispositivo pedagógico que informa e educa as pessoas, construindo padrões e influenciando de forma incessante a busca pela beleza considerada plena, estimulando o consumo de produtos cosméticos e práticas que visam cumprir a exigências deste corpo “modelo”. A beleza feminina se tornou um dever moral, obrigação que por vezes requer “sacrifícios”: dietas, malhação, cirurgias plásticas, e muitos outros. Estar bem surge como sinônimo de parecer jovem. Desta maneira, o intuito é o rejuvenescimento, já que a velhice se tornou um fantasma.

Fato é que as incapazes de gerir a própria imagem são consideradas socialmente inadequadas; e que a máxima de Vinicius de Moraes “as feias que me perdoem, mas beleza é fundamental” nunca esteve tão em voga. Pode ser magra, gordinha, preta, branca, oriental, rica ou pobre, idosa ou novinha; MAS, tem que estar “arrumada”. No entanto, os acessos aos padrões de beleza dependem, sobretudo, de relativa estabilidade econômica. Melhor dizendo, não há como viver arrumada sem dinheiro. 

Estamos em março, “mês das mulheres”. Período favorável para pensarmos sobre as condições femininas e tentarmos responder à pergunta feita por Freud. Mas o comércio está mesmo (e como sempre) focado nos negócios. Essa “distração” em fazer da data um dia “propício para as vendas” e “homenagear a feminilidade” em detrimento das causas referentes as mulheres, colaboram com a perpetuação da misoginia e faz a alegria do mercado. Afinal, nada mais cômodo para os homens e para o capitalismo que as mulheres sejam belas, independentes financeiramente e caladas perante ao machismo diário.

Não haveria como ser diferente. Isto porque o patriarcado é machista e capitalista. Assim não fosse, e não teríamos, em pleno século XXI, por iniciativa dos patronatos, concursos de “Miss Comerciária” em centenas de cidades por todo o país. Tão enraizado o machismo, que ainda parece óbvio que o ambiente profissional represente espaço ideal para que a beleza e elegância feminina seja considerada mais importante que sua eficiência, daí a relevância do título que “muito nos honra”. 

Nada contra ser presenteada, nada contra feminilidade e beleza. Porém, precisamos tratar de assuntos mais importantes como a necessidade de equiparação salarial, da luta contra a violência doméstica e feminicídio (500 mulheres são vítimas de agressão física a cada hora no Brasil e 13 são assassinadas diariamente) das micro agressões (humilhações, assédios, ofensas, interrupções, etc.) que estamos sujeitas o tempo todo, todos os dias. 

Quer presentear? Tudo bem, presenteie. Mas, faça a “lição de casa” e não seja babaca de acreditar que ser homem significa exercer “dominação masculina”. Respondendo a famosa pergunta inicial feita pelo Dr. Freud, digo que as mulheres querem respeito, muito respeito. E alguma liberdade que nos possibilite construir e expressar nossa verdadeira beleza. Tão rica que não pode ser comprada nas promoções de março. 

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