quarta, 30 de abril de 2025
Publicado em 16 jun 2015 - 08:49:41
Neusa Fleury
Das coisas que só um ourinhense entende, muitas estão relacionadas com a Fapi, a nossa Feira que de agropecuária hoje tem muito pouco (esta região marcada pela monocultura e pequena atividade pecuária não motiva mais para um evento com essas características). Então o que justifica a Fapi, além dos lucros para uns e outros e chances de promoções políticas? Acredito que são também as recordações, as oportunidades de convivência. Numa cidade sem áreas públicas conservadas para passeios em família, ir para a Fapi é uma oportunidade de encontros – e por isso ficam perdoados o sofrível repertório musical, a poluição visual, o barulho e as meninas de shorts e barrigas de fora em noites frias.
Não é fácil acompanhar as crianças nas imensas filas do parque de diversões, mas compensa ao ver a alegria. Enfrentar medos em brinquedos ousados é motivo para contar a proeza para os avós ou amigos da escola. Também vira assunto o tamanho do congestionamento antes do show de alguma celebridade do momento. A Monga, mulher gorila, também ronda as lembranças de quem visitou a Fapi quando criança. Lembro de um menininho que queria muito ver a moça. Fiquei lá fora esperando. Quando a música começou a ficar mais tensa e a gorila ameaçou quebrar as grades da jaula, eis que surge o moleque correndo apavorado, antes do final da performance. Sei que não deveria rir, já que seu medo era verdadeiro – mas como?
Tem quem não sossega enquanto não come uma maçã do amor, um saquinho de coco tostado com açúcar ou uma cocada de fiapos. Nada que não seja encontrado em outras épocas do ano, mas que têm gosto especial quando é saboreado no recinto empoeirado da Feira. Não sei se existe ainda, mas houve uma época em que havia um serviço de alto-falante que funcionava como um correio-elegante. O fulano mandava recado para a mocinha, que deveria esperá-lo na escadaria do Parque. Só ourinhense entende o que pode existir de expectativas e fantasias em um recadinho desses.
Não fui criança em Ourinhos, então vi a Fapi de longe, de visitas com colegas de escola. Isso faz tanto tempo que na época o brinquedo mais arriscado era o tobogã. Precisava ter coragem para subir aquelas escadarias e encarar a descida olhando lá de cima. Se por um instante a gente se lembrasse daquela história que todo mundo dizia a respeito da gilete colocada de pé entre as placas do brinquedo não havia quem convencesse a descer. Não sei o motivo pelo qual, quando me lembro do tobogã da Fapi, lembro-me de um amigo que morreu jovem, de uma família rica da região. Era uma dessas tardes frias que parece que também não existem mais, e meu amigo estava sem agasalho, batendo queixo olhando para o alto do tobogã. Ficou assim, congelado para sempre na minha memória.
Parece que ir à Fapi conforta nossa saudade da terra e da vida rural. O cheiro de merda de vaca, o barro vermelho grudado nas botas e certa camaradagem coletiva rondam o ambiente. Claro que eu posso dizer que virou uma quermesse; que prejudica os comerciantes da cidade; que existem bares demais no recinto; que os jovens abusam da bebida; que são horríveis aquelas faixas saudando uns e outros penduradas por todo lado, e que nunca tem nada de novo. Até as manchetes dos jornais todo ano batem no surrado e vazio slogan: “a maior feira de portões abertos…” É fácil achar centenas de motivos para não ir, principalmente se as crianças cresceram e ninguém fica pedindo para ir ao parque. Eu tenho mais motivos ainda para não gostar, já que moro no Jardim América e o volume do som dos shows é absurdo – piora que alguns são parecidos com karaokê, de tão ruinzinhos.
Nada de novo. Assim como não tem nada de novo em gritar de dentro do carro quando se passa debaixo do viaduto da rua São Paulo, esgoelar espremido assistindo a um show de cantor sertanejo ou arriscar uma paquera no meio do tumulto.
Nada de novo, mas para quem exp
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