segunda, 07 de outubro de 2024

CPI do vale transporte aponta desvio de quase R$ 4 milhões na prefeitura

Publicado em 14 ago 2015 - 02:26:12

           

José Luiz Martins

Próximo de completar um ano, a segunda CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) do governo Belkis, instaurada pela Câmara em outubro de 2014 concluiu seus trabalhos na última segunda-feira (10/08). A CPI do Vale Transporte, como ficou conhecida, investigou denúncia do vereador Silvonei Rodrigues (Esquilo) feita no final de 2013 sobre irregularidades na compra e distribuição de vale transporte pela prefeitura aos servidores públicos municipais.

Em novembro do mesmo ano o executivo determinou a formação de Comissão Sindicante para proceder à apuração dos fatos, a sindicância levou seis meses para analisar documentos relativos ao caso no período entre janeiro de 2009 e outubro de 2014. Formada por servidores públicos efetivos, ao final a comissão Sindicante em seu relatório constatou irregularidades concentradas no setor de Recursos Humanos com claros indícios de desvio de valores. 

O resultado da sindicância foi enviado ao Ministério Público e um Processo Administrativo Disciplinar foi instaurado pela prefeitura para apurar as responsabilidades. Quatro meses depois houve a criação da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar o caso, proposta pelo vereador Inácio J. B. Filho sendo aprovada com assinaturas dos vereadores Antonio Carlos Mazetti (Tico), Lucas Pocay e Cido do Sindicato. Através de sorteio os nomes que integrariam a comissão ficaram definidos com Flavio Ambrozin (relator), Alexandre Florêncio Dias, Edvaldo Lucio Abel (presidente), Aparecido Luiz e José Roberto Tasca, substituído posteriormente por Silvonei Rodrigues.

O fio condutor dos trabalhos da comissão foi a sindicância feita pela prefeitura, o objetivo dos parlamentares era desvendar os responsáveis diretos pelo esquema de desvio e a conivência de autoridades e servidores municipais. Vinte pessoas foram ouvidas, tudo que foi produzido pela comissão sindicante e pelo processo administrativo foi requisitado pelos vereadores.

Depois de dez meses analisando milhares de páginas de documentos, de ouvir as 20 testemunhas teoricamente implicadas, a CPI mediante método de estimativa e comparativos chegou a valores pagos a maior de 2009 a 2013 concluindo que houve danos aos cofres públicos. Em tese, aproximadamente R$ 3.764.276,69 (três milhões, setecentos e sessenta e quatro mil, duzentos e setenta e seis reais e sessenta e nove centavos) teriam sidos desviados, com dois servidores do setor de Recursos Humanos da PMO sendo responsabilizados pelo dano ao erário.

Conforme o relatório e pelo que consta nos autos (provas documentais e provas testemunhais), restou comprovado pela CPI a autoria dos fatos apurados, de maneira irrefutável, primeiramente configurando-se na pessoa do ex-servidor (concursado-efetivo) Fábio António Bertaia. Conforme a CPI, o ex servidor, demitido após a Sindicância e Processo Administrativo Disciplinar, era o responsável por quantificar, requisitar, retirar na empresa AVOA os cartões do vale transporte distribuídos aos servidores.

Era responsável também por listas enviadas as secretarias, assinaturas de recibos pelos beneficiados e pelo recebimento eventual da devolução de sobras, além dos lançamentos na folha de pagamento para desconto dos servidores. O relatório da CPI com 52 páginas diz que os fatos e as provas pela prática delituosa e regras funcionais recaem sobre Bertaia, que se utilizava de um “pen drive” seu, sem justificativa plausível para armazenar, manusear todas as informações e procedimentos relativos ao programa de vale transporte dos servidores.

Os dados referentes ao programa deveriam estar armazenados nos computadores do setor de RH, mas foram salvos no dispositivo móvel particular do servidor sem que qualquer informação fosse encontrada nos computadores da rede da PMO. Ele não soube explicar pontos ainda obscuros e informações que poderiam desvendar a maneira como os valores foram manipulados e o seu destino, segundo o servidor o “pen Drive” não foi apresentado na sindicância e nem na CPI, pois, o mesmo o perdeu.

Ele alega inocência e diz não entender como se chegou a esses números. Já o ex-servidor também demitido, José Carlos Alexandre Pereira (cargo de confiança indicado por um ex-vereador), está sendo acusado de coautor em razão de sua responsabilidade como superior imediato do servidor Fábio Antonio Bertaia. José Carlos era o responsável pelas conferências dos procedimentos adotados pelo subordinado quanto a aquisição e distribuição dos vales. Ele admitiu a CPI que falhou diante das atribuições que seu cargo exigia, e por ter confiado no seu subordinado não realizou as conferências obrigatórias validando a situação e autorizando os pagamentos das notas fiscais emitidas pela AVOA.

O relatório da CPI apontando o desvio foi enviado ao Ministério Público, o promotor Adelino Lorenzeti Neto já cuida do caso desde a conclusão da Sindicância e do Processo Administrativo Disciplinar no início de 2014, que culminou com a demissão dos dois ex-servidores. O procedimento preparatório de Inquérito Civil no MP foi instaurado desde essa época e a Policia Civil já deve estar atuando na apuração.

A depender do resultado das investigações na promotoria, se comprovado dano ao erário como apontou a sindicância e a CPI, caberá à abertura de Ação Cível Criminal por improbidade contra os ex-servidores e autoridades municipais possivelmente envolvidas. 

O que disseram alguns vereadores sobre o caso após a aprovação por unanimidade do relatório da CPI

Inácio J. B. Filho – O que está ocorrendo aqui em Ourinhos hoje na Câmara Municipal, podemos dizer que é quebrando tabus, essa analogia pode ser feita. O que a gente sempre houve dizer por aí é que as CPIs sempre acabam em pizza. (…) o que nós estamos vendo aqui hoje é completamente diferente desse pensamento, um rombo de 3 milhões e 700 mil reais desde 2009.

Eu gostaria de citar aqui o depoimento da servidora Maria Cristina da Silva (gerente de Medicina do Trabalho) no qual disse que inicialmente fez os questionamentos de distribuição de vale transporte verbalmente por 4 vezes ao servidor Fábio Bertaia e depois fez por escrito via circular interna por não ter sido atendida. Inclusive encaminhando ao encarregado do setor Paulo Sackis, bem como ao secretário de administração José Luiz Quenca. (…) Eu fico até assustado, porque a gente vê que vai sobrar apenas para aquelas pessoas que ocupam cargos lá embaixo. Sendo que em outros depoimentos a gente vê aqui o servidor José Carlos Alexandre Pereira perguntando por que o departamento de finanças não viu isso (…) enfim o importante é as pessoas e a cidade de Ourinhos saber que de 2009 até 2014 houve um desfalque dos cofres públicos, esse dinheiro tem que estar em algum lugar. Ouvimos aqui que o Sr. Fabio António Bertaia apontado como o grande mentor de tudo isso, e ele dizendo que é inocente e que agora sequer tem emprego, não tem dinheiro para pagar suas contas com seus bens sendo devolvidos a credores (…) Então alguém está com esse dinheiro, 3 milhões e 700 mil sumiram, o que é praticamente o orçamento de algumas secretarias. Fica o nosso orgulho com a CPI de ter apurado e ter chegado a esses números, mas também a decepção em saber que as administrações Toshio (2009 a 2012) e Belkis (2013 e 2014) não fiscalizaram nada, agora ninguém sabe e ninguém viu, o dinheiro simplesmente desapareceu dos cofres da prefeitura. Eu vi depoimentos nesse relatório que infelizmente leva aos funcionários de baixo escalão, se isso é numa empresa privada não é só os pequenininhos que iam levar a bronca não. Mais pessoas teriam que pagar essa conta, nós não podemos incriminar ninguém, não podemos fazer esse julgamento final não somos a justiça, mas gostaria de ver outros responsáveis, como os secretários das pastas que tem que ter responsabilidade, não jogar a culpa nos pequeninhos. 

 Edvaldo Lucio Abel – Eu como presidente dessa CPI, agradeço o empenho de todos vereadores que fizeram parte da comissão. Foi tudo transparente e aberto, e é importante falar que muitas pessoas diziam que tudo ia acabar em pizza. Não, a Câmara Municipal fez seu papel (…) também agradeço aos funcionários da casa que foram importantíssimos, separando todos os documentos enviados pela AVOA e Prefeitura, fizeram gráficos comparativos a números e valores que no final nos deu tranquilidade em fazer esse relatório que traduz um desvio de mais de R$ 3.700.000,00, essa é a conclusão depois de analisar e fazer comparativos de todos os documentos enviados. Agora será enviado ao Ministério Público (MP), chegamos a alguns nomes, mas discordo do vereador Inácio de que a corda vai arrebentar do lado mais fraco. Não, nós não tratamos de forma diferente pequenos e grandes, todos foram tratados pela comissão de forma igual sem distinção e isso pode ser comprovado por outros vereadores. Não terminou em pizza (…) o desvio existe e está tudo aí de forma bem clara, eu espero agora que o MP tome realmente as providências e chegue a essa pessoa ou a essas pessoas que fizeram a cidade de Ourinhos virar notícia de uma forma péssima. 

Cido do Sindicato – Como disse o presidente nós fizemos parte da CPI, acredito que esse relatório vai ajudar muito o MP e a polícia a chegar nos verdadeiros responsáveis, (…) Nesse relatório de acordo com a CPI, foram ouvidas realmente as pessoas que poderiam nos ter revelado algo além do que foi concluído, tanto na comissão sindicante e processante. Mais de 20 pessoas foram ouvidas nessa casa, e acredito o relatório servirá de base para que o MP faça com que esses R$ 3.700.000,00 sejam devolvidos aos cofres públicos e se realmente o MP entender que existe mais de um culpado que seja aplicado as penas que prevê a lei. (…) está aqui uma bela ferramenta para o Ministério Público e a polícia, a CPI cumpriu o seu papel não terminou em pizza o relatório é sério e servirá para que se chegue a esse dinheiro desviado. 

Lucas Pocay – Realmente este trabalho feito pelos vereadores que participaram dessa CPI, é muito diferente do que ouvíamos por aí. De que não ia acontecer nada que iam abafar tudo, e realmente os vereadores fizeram o seu papel. Ouviram as testemunhas, tem depoimentos sérios aqui, graves, inclusive com ameaças e tudo isso o poder judiciário irá analisar. Tem alguns pontos ainda questionáveis, por que a culpa imputada a 2 pessoas sendo que parece que essas pessoas não têm uma conta tão grande assim. Esses 3 milhões e 700 mil precisam ser achado, onde estará, porque o povo vai cobrar, esta casa vai cobrar, não vai ficar apenas nesse relatório final não. Da mesma forma nós continuaremos agora com o MP, acompanhando os trabalhos, as próximas etapas, esse dinheiro precisa voltar para os cofres públicos em benefício à população que hoje está extremamente carente. Em todos os bairros e em todas as áreas a prefeitura atualmente não está tendo condições de manter nem a limpeza da cidade. Realmente é muito grave e é importante a população ter este conhecimento de que fica comprovado que está faltando um comando, fizeram isso tudo, esse desvio por tantos anos e ninguém havia percebido isso. Será que não tem mais gente sabendo disso? E essa cobrança é justamente o nosso dever de fiscalizar, acompanhar, de estar em conjunto com o executivo quando eles querem, fazendo as coisas boas para nossa cidade.  

Flávio Ambrozin (Relator da CPI) – Quero agradecer os funcionários da câmara que auxiliaram nesse trabalho, funcionários que demonstraram uma competência e dedicação extrema. Aos membros da CPI que nesses dez meses toda semana se reunia na casa analisando, estudando e verificando a documentação que chegou até nossas mãos da AVOA, da Prefeitura, do Ministério Público. Foram 20 pessoas ouvidas, onde a gente pode comparar os depoimentos, analisar o que cada um disse, nós fizemos um trabalho visando descobrir o que realmente aconteceu e chegamos em tese a esses valores consideráveis. Todas as pessoas ouvidas apontaram para um servidor, todas citaram como eram feitas a requisição e a distribuição do vale transporte, e se há mais alguma coisa, pessoa ou várias em relação ao caso isso não chegou até a CPI. Tenho certeza que a CPI vai contribuir muito para que o MP esclareça mais alguma coisa, se há realmente mais pessoas envolvidas ou não. Nesse momento chegamos a essa conclusão, o trabalho da CPI foi exemplar.

Alexandre Dauage – Pude acompanhar de perto o trabalho da CPI e gostaria de parabenizar os membros, foi um trabalho cansativo e árduo. Mas quero deixar claro que fiquei muito triste pois nós vemos não só nessa CPI mas a nível nacional, que sempre que há uma investigação é apontado sim os acusados, mas o dinheiro nunca aparece. Estou falando porque não me convenceu na verdade o fato dessa quantia e valor desviado serem responsabilizados somente a esses dois ex-funcionários. Tenho certeza como foi falado por alguns vereadores e no relatório houve ameaças, e queria dizer a eles que coloquem a mão na consciência e não assumam uma culpa dessa, não coloquem sua dignidade e honra para acobertar outras pessoas. Não deixem de ter dignidade, poder sair nas ruas, ir ao supermercado, vocês têm família e se por ventura tiverem mais alguma coisa a dizer, digam. Vocês vão ter essa oportunidade. 

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