sexta, 08 de dezembro de 2023

Os flashes fizeram a história de Toninho fotógrafo

Rose Pimentel Mader

A fotografia digital se popularizou de forma massiva nessa última década. Há sempre uma câmera por perto; nas ruas ou em qualquer outro lugar é comum pessoas com smartphones cheios de funções registrando com facilidades o que enxergam em seu cotidiano. A variedade de dispositivos no mercado e a vastidão de imagens compartilhadas na rede todos os dias demonstram que o digital tornou a fotografia uma atividade acessível a todos os interessados. Mas, afinal, essas facilidades estão derrubando barreiras entre fotógrafos profissionais e amadores? Estaria a foto digital ‘matando’ a fotografia profissional?

A Era Digital ditou novos caminhos para os profissionais de fotografia. Os famosos Fotos acabaram fechando suas portas ou se adaptando à nova realidade. Em Ourinhos, poucos continuam atuando como é o caso do Foto Toninho. Consciente dos benefícios das novas tecnologias e totalmente adaptado aos novos tempos, o fotógrafo Toninho mantém desde 1986, ou seja, há 30 anos, o seu Foto na rua Antonio Carlos Mori.

Há 49 anos “revelando amigos”, como gosta de dizer, Toninho, Antonio Luiz Ferreira, que tem o mesmo nome de um saudoso prefeito de Ourinhos, ingressou no mundo da fotografia em 1967, como aprendiz no famoso Foto Olímpico de Paulo Myaúra. Aprendeu com ele tudo sobre fotografia e, desde 1974, tem seu próprio Foto. “Devo tudo que tenho à fotografia. Tudo que conquistei na vida foi graças a ela, inclusive a oportunidade de ingressar na Polícia Técnica, onde trabalhei durante 23 anos como fotógrafo técnico pericial, atividade na qual me aposentei há dois anos”, conta Toninho.

Coração ourinhense – Toninho, 64 anos, nasceu em Wenceslau Braz (PR), e veio para Ourinhos em 1957, com 5 anos de idade, com os pais José Jesus Ferreira e Helena Barbaneiro Ferreira e seus 4 irmãos. O pai, telegrafista da Rede Ferroviária Federal Santa Catarina, acatou a recomendação do médico Luiz Monzillo para que a esposa, doente, morasse numa cidade de clima quente. “A Rede ofereceu duas opções, Londrina e Ourinhos, mas meu pai aceitou o convite do Dr. Monzillo”.

“Sou ourinhense de coração, aqui vivi toda a minha vida, constitui a minha família, conquistei um ofício e tudo que almejei. Sou muito feliz aqui”, afirma Toninho que é casado com Simone e tem um casal de filhos – Ricardo, engenheiro eletricista e de segurança do trabalho que trabalha na Polícia Técnica e Fabiana, psicopedagoga, professora da rede municipal de ensino.

A vida no “Tremller” – Toninho recorda que a luta foi árdua desde criança. Durante os seis primeiros meses em Ourinhos, a família morou num carvoeiro no final da linha do trem, num desvio. Um fato curioso acontecia toda vez que era feita a troca de vagão: o fogareiro onde a mãe cozinhava era colocado junto aos trilhos e quando o vagão saia ele ficava; os vizinhos guardavam a panela com a comida. “Costumo dizer que morávamos num “tremller”. Foram tempos muito difíceis”.

Perdemos o romantismo – Toninho diz que jamais imaginou que um dia iríamos fotografar sem filme. “Ainda hoje muitos saudosistas ainda compram filmes e muitos revelam as fotos digitais, mas nada comparado ao que fazíamos no passado quando a revelação do papel tinha de ser com luz vermelha bem fraca e o filme em total escuridão. Não havia xerox, só fotocópia que utilizava papel fotográfico da Kodak. Era um processo manual complexo”, conta Toninho.

“Sempre gostei muito de fazer montagens fotográficas. As máquinas eram bem diferentes. Hoje tudo é muito mais fácil e a fotografia, como muita coisa na nossa vida, perdeu o romantismo. Atualmente fazemos e revelamos mais fotos 3 x 4 digital. Antigamente havia pelo menos uns oito Fotos no centro da cidade: Minoru, Kuniyoshi, Carnaval, Mitsuo, Trujillo, Foto Center, Kaihara. Hoje só tem eu, o Nagita, o Foto Kleber que trabalha mais com eventos”.

“Surgiram novos profissionais que atuam especialmente nos eventos sociais como casamentos e aniversários e que trabalham em casa”, afirma Toninho. “Hoje não faço mais eventos, trabalho mais no Foto e aqui vou ficando até quando tiver saúde. Esse fenômeno dos Poupatempos, que existe em todo lugar, apesar dos benefícios de agilizar a vida das pessoas, atrapalhou os Fotos. Eles fazem a foto 3 x 4, mas penso que a foto deveria ficar com o fotógrafo, com os Fotos que pagam seus impostos”, observa.

Lembranças de um fotógrafo – Toninho recorda com saudosismo os velhos tempos e conta que a emoção de fotografar era única. “Quando íamos fotografar uma festa, especialmente um casamento, a gente entrava no clima e conseguia, graças a essa interação com aquele momento, captar através das lentes até mesmo uma lágrima na face dos noivos”.

E não faltaram fatos interessantes e curiosos nessa vida de fotógrafo, como a história do noivo que foi mostrar a aliança para um padrinho e esta caiu na palha de arroz e nunca mais foi encontrada. “As festas antigamente eram simples, não tinha todo esse aparato que tem hoje, agora tudo está diferente, tem uma equipe de profissionais para cuidar de cada detalhe. Certa vez as daminhas entregaram ao noivo no altar a caixa de alianças vazia, foi um grande alvoroço, o celebrante padre Bernardino parou o casamento para que as alianças fossem encontradas e eu fui o felizardo, as encontrei na porta da igreja”, recorda.

Paixão pelos Beatles – A fotografia permeou todos os seus caminhos e através dos flashes da câmera construiu a sua história. História de um vencedor, história de um sonhador, assim como John Lennon, gosta de observar Toninho, e de sua lendária banda, os Beatles, sua eterna fonte de inspiração. “Sou um beatle maníaco em estado avançado” e quem o conhece, naturalmente concorda.

Depois da família e da fotografia, a maior paixão da vida de Toninho são os Beatles. Toninho incorporou em sua vida a música, a mensagem e a magia que os Beatles plantaram no mundo e no coração da geração dos anos 60. “Não só me vestia igual e usava o mesmo estilo de cabelo, como me inspirava na mensagem deles e cheguei a montar uma banda em 1969, The Liverpool, em homenagem à cidade onde nasceram. Na Banda tocava o Neno (falecido), Netinho e Zé Carlos Bertanha. Eu fazia o vocal. Compramos os instrumentos em Sorocaba, duas guitarras, bateria, contrabaixo e o microfone, mas não conseguimos pagar e tivemos que devolver os instrumentos. A Banda The Liverpool durou apenas um ano”.

“A herança dos Beatles foi extraordinária. Os Beatles são inesquecíveis. A música teve dois tempos: antes e depois dos garotos de Liverpool”, afirma. Toninho junto com o irmão Valdo fundou o Manchester e foi presidente do histórico Clube dos Jovens Terríveis. “Sempre procurei fazer o social, colaborar na comunidade, contribuir para a cidade que nos abraçou como filho”. Toninho observa: “o mundo mudou, a fotografia mudou, temos muito mais facilidades e possibilidades, mas de certa forma a vida perdeu aquele encantamento. Mas estamos aqui, vivendo e lutando e todos os dias agradeço a Deus e à fotografia pelas conquistas que alcancei, na certeza de que faria tudo de novo. E continuo sonhando, afinal como disse John Lennon, “eu sou um sonhador”. E um dos sonhos, claro: conhecer Liverpool. Com certeza  vai realizá-lo! 

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