domingo, 08 de setembro de 2024

Ourinhos deixa de recuperar 6.000 detentos no CR desde 2005, diz APAC

Publicado em 25 set 2015 - 03:16:17

           

Hernani Corrêa

Ao final da última sessão da Câmara Municipal de Ourinhos, na segunda-feira, 21, o sr. Gilberto de Oliveira, tesoureiro da APAC – Associação de Proteção e Amparo aos Condenados de Ourinhos, saiu aos berros em protesto contra os vereadores ourinhenses, afirmando que já foi impedido quatro vezes de falar na Tribuna (veja o vídeo no site do Jornal). O motivo seria um entrave criado entre as duas entidades, onde ele alega estar sendo prejudicado pelo Legislativo na construção do novo CR – Centro de Ressocialização.

Atualmente a APAC presta serviços de reeducação e ressocialização para 125 detentos na antiga cadeia pública de Ourinhos, localizada no início da Avenida Jacinto Sá. A reportagem falou com exclusividade com Oliveira.

“Gostaria de contar sobre um menino que saiu do CR faz 15 dias. Era um menino de rua, de família humilde, a mãe cata papel, uma humildade tremenda. Era analfabeto e saiu lendo e escrevendo, com noção de informática, curso de eletricista, de pedreiro e de soldador. E começa hoje, 23/09, a trabalhar na Zanuto como soldador. É um exemplo de como é o CR”, conta orgulhoso, Gilberto.

Ele lamenta não ter melhor estrutura para atender mais gente. “Infelizmente, no bom sentido, porque nós não temos estrutura para ter um CR. Os nossos detentos estudam sentados num banquinho, comem e dormem no chão, põem o material de estudo no colo e, mesmo assim, nós ressocializamos 81% dos que passam em nossas mãos, graças a Deus. E nós temos outros quatro que trabalham na Zanuto e também eram analfabetos”, diz com satisfação e alegria.

Os detentos do CR são escolhidos a dedo pela própria APAC para ficarem em Ourinhos e tem que cumprir algumas exigências e obrigações. “Aqui eles são obrigados a estudar, a fazer cursos, pois aqui temos de pedreiro, encanador, eletricista, garçom, soldador, padeiro, confeiteiro e cada um faz aquilo de acordo com sua vocação”, assegura.

Compromisso do CR – Algo muito importante citado pelo membro da APAC é o compromisso da entidade de empregar o detento no final do cumprimento de sua pena. “Ele cumpriu sua pena, nós deixamos ele trabalhando em alguma empresa. Temos diversos na Castor, Zanuto, Injex. Na verdade é a maior maravilha que pode acontecer com o ser humano que antes era um moleque jogado na rua, drogado”. E vai além. “A maioria, 83% do que temos aqui é por causa de droga. Ele roubou, mas não é ladrão, roubou para manter o seu vício. Ele traficou, mas não é traficante, traficou porque pegou 60 pedras de um traficante para vender e o resto é para consumo, na verdade é um usuário. Graças a Deus, temos a maior felicidade de falar: 81% ressocializa e recupera”, esclarece Sr. Gilberto, mostrando os resultados do trabalho.

Sem assistência – Oliveira lamenta não poder fazer muito mais. “Por outro lado o que me doeu e me dói é o que estamos sofrendo. A APAC deixou de ressocializar mais de 6.000 detentos desde 2000, quando nós ganhamos um terreno para fazer um CR, atender 210 condenados e a Câmara negou. Tentamos novamente em 2003, não tivemos a felicidade e em 2005, o Dr. Nagashi, vendo nossa situação e querendo criar o CR em todas as cidades de médio porte, para não precisar construir penitenciárias, transferiu a Cadeia Pública de Ourinhos para Sistema Penitenciário. E não tínhamos apoio da Câmara. Ainda assim, um vereador apresentou um projeto de lei que foi aprovado por todos, proibindo Ourinhos de ter penitenciária, CPP, Casa do Menor e CR. Mas, graças a Deus, o Estado não precisa pedir para a Câmara e nós estamos desde então com 125 reenducandos, mais ou menos uns 50 no regime semi aberto trabalhando na prefeitura em vários lugares, como no torno, na jardinagem, mas deixando de atender 90”, lamenta.

Critérios para ser um reenducando do CR de Ourinhos – Não é qualquer preso que pode ser transferido para Ourinhos. “Primeira coisa, ser primário, não estar respondendo a nenhum processo pelo qual ele já está condenado, não pode estar condenado há mais de 10 anos. O que nós olhamos muito ainda é o perfil da pessoa, se tem condições e interesse em ressocializar-se. Tem muitos que já estão comprometidos com o PCC – Primeiro Comando da Capital, a família quer, ele quer, mas não vem. Infelizmente, a guerra é muito grande entre PCC e CR. Nós não aceitamos eles e eles não nos aceitam. Nós exigimos muito para que uma ovelha negra não venha estragar as outras. Fazemos uma fiscalização muito grande para trazer somente gente com perfil do CR”, explica Sr. Gilberto.

Índices de ressocialização poderiam ser maiores – Ourinhos possui uma estrutura pequena de atendimento, daí o fato de se ter apenas pouco mais de 80% de resultados. “Tenho certeza que se tivéssemos estrutura suficiente, estaríamos com índices muito maiores de recuperação como Jaú (93%) e Araraquara (91%). Não temos condições de nada aqui, não temos salas para estudar a noite, está muito difícil de trabalhar. Se Deus abençoar que saia essa reforma para 210 reenducandos, que o diretor garantiu, aí ficaríamos muito mais felizes”, afirmou Oliveira.

Diferença de Centro de Ressocialização e Penitenciária – A falta de conhecimento da população de Ourinhos da diferença entre as duas instituições, foi fato explorado pela Câmara Municipal, segundo sr. Gilberto, quando “jogou” a cidade contra a APAC na época. “Sofremos muito com isso até hoje, pois existe o medo e o terror de que vamos encher a cidade de bandidos e Ourinhos perderá a segurança. Não é nada disso, as pessoas, as autoridades, os vereadores todos deveriam ir conhecer nossos trabalhos. Uma penitenciária é somente um local onde os detentos de menor ou maior periculosidade cumprem pena, não têm nenhuma atividade e ainda ficam ali dentro dando ordens para outros aqui fora. O CR é tudo isso que já falei e dei exemplo no início desta reportagem, onde conseguimos recuperar os detentos. É só isso que gostaria de esclarecer quando peço para falar na Tribuna da Câmara e já me foi negado quatro vezes. Tem até vereador que se surpreendeu com minhas explicações e exemplos e se arrependeu de ter votado precipitadamente e contra a construção do novo CR em Ourinhos anteriormente”, finalizou.

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