terça, 17 de junho de 2025
Publicado em 18 fev 2018 - 10:57:21
Rose Pimentel Mader
O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo confirmou a condenação imposta pela juíza Nélia Aparecida Toledo Azevedo, da Vara Cível de Santa Rita do Passa Quatro (SP), em 7 de novembro de 2007, para que a Companhia Muller de Bebidas, de Pirassununga, interior de São Paulo, fabricante da “cachaça 51”, abstenha-se de introduzir e recolha de circulação nacional todos os litros com a logomarca “51” em relevo, fabricados e introduzidos no mercado depois de 1º de fevereiro de 1995.
O acórdão, disponibilizado no Diário Oficial do Estado de São Paulo de 22 de janeiro de 2018, é da 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, sob a Relatoria do desembargador Eduardo Sá Pinto Sandeville.
Concorrência desleal – No setor em que atuam, em regra, muitas empresas engarrafam aguardente de cana de açúcar em recipientes de vidro retornáveis postos no mercado, ou seja, reutilizáveis, o que usualmente se denomina “giro de vasilhames”.
A discussão envolvendo os litros com a marca “51” iniciou-se nos idos dos anos 80 e, desde então, vem suscitando várias batalhas judiciais. As concorrentes alegam que há abuso de poder econômico e prática de concorrência desleal por parte da Cachaça ‘51”, ao impedir que os litros sejam indistintamente reutilizados pelas empresas do setor, como ocorre em outros segmentos econômicos, a exemplo das garrafas de cerveja, dos botijões de gás e dos barris de chopp reutilizáveis. Ao se misturarem os litros marcados “51” com os litros lisos, inviabilizam os processos industriais de outras empresas, em benefício somente da Muller, já que é praticamente impossível a separação manual dos litros em escala industrial, o que, segundo as alegações das concorrentes, aceitas pelo Tribunal, prejudica a livre concorrência.
Acordo judicial – Em 1995, a empresa Muller (“Cachaça 51”) havia firmado acordo judicial com as concorrentes Caninha Oncinha Ltda., de Ourinhos (SP), e Missiato Indústria e Comércio Ltda., de Santa Rita do Passa Quatro (SP), fabricantes das cachaças “Oncinha” e “61 EMI”, obrigando-se a não mais mandar fabricar e inserir no mercado litros reutilizáveis contendo sua logomarca em relevo.
A “Muller”, no entanto, foi acusada pelas empresas concorrentes, de abuso do poder econômico, com atos tendentes a eliminar a concorrência, em razão da gravação do logotipo “51” nos litros de uso comum.
De acordo com o advogado Carlos Ferraz que representa as empresas Oncinha e Missiato, após firmar o acordo judicial, a “51” ingressou com quatro pedidos de privilégios sobre modelos de litros, sobre os quais pretendia exclusividade, e reiniciou a introdução dos litros marcados no mercado. Posteriormente, as patentes foram declaradas nulas pelo INPI (Instituto Nacional de Propriedade Industrial), que entendeu pela falta de novidade e originalidade nos objetos, atendendo a requerimento de outra concorrente, a Indústria de Bebidas Pirassununga Ltda., de Pirassununga (SP), fabricante da “Cachaça Villa Velha”.
Com o intuito de reverter a situação, a “Muller” ajuizou ações junto à Justiça Federal do Rio de Janeiro, questionando as decisões administrativas do INPI, mas foi vencida no âmbito do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, que manteve as nulidades das patentes decretadas pelo referido órgão.
A Justiça concluiu que se a “Muller” pretende utilizar-se de recipientes personalizados, que o faça de forma a não se confundirem ou misturarem aos reutilizados também pelos demais concorrentes.
Por entenderem que a “Muller” havido descumprido o acordo judicial, as concorrentes “Oncinha” e Missiato” requereram a execução do acordo judicial em 2002 perante a Justiça de Santa Rita do Passa Quatro, que determinou à “Muller” a retirada, no prazo de 30 dias, dos litros com a logomarca “51” de todo território nacional, inseridos no mercado depois de 1º de fevereiro de 1995, sob pena de multa diária de 100 salários mínimos por dia de descumprimento da decisão judicial.
Segundo informações da Cachaça “51” apresentadas à Justiça, após o acordo, foram colocados no mercado mais de 226.554.462 litros personalizados, configurando assim o seu total descumprimento.
Multa milionária – Desde maio de 2004, data da decisão da liminar da juíza de Santa Rita de Passa Quatro, confirmada pelo Tribunal de Justiça, são mais de 5.300 dias de descumprimento de acordo judicial, sendo que, desde então, a multa diária imposta à “Muller”, calculada com base no valor atual do salário mínimo, corresponderia hoje a montante superior a R$ 500.000.000,00 (quinhentos milhões de reais).
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