quinta, 28 de março de 2024

Agosto Lilás: combate à violência contra a mulher

Em Ourinhos, os números de casos de crimes contra a mulher vêm diminuindo a cada ano

 

Juliana Neves

 

A edição do Atlas da Violência do ano de 2019, aponta que houve um crescimento de homicídios femininos no Brasil em 2017, com 13 assassinatos por dia, um total de 4.936 mulheres mortas. O maior número desde 2007.

É um aumento expressivo de 30,7% de homicídio contra mulher, uma análise temporal de 2007 a 2017, isto é, um registro de 6,3% de aumento em comparação ao ano anterior. O estado de São Paulo é o que possui o menor número de homicídio com 2,2 a cada 100 mil mulheres.

Os dados são observados a partir de casos de violência contra a mulher dentro de residências, o mais comum com uma porcentagem de 42% dos casos, como nas ruas. São crimes reconhecidos como feminicídio, o homicídio praticado contra a mulher em decorrência do fato de ela ser mulher (misoginia e menosprezo pela condição feminina ou discriminação de gênero, fatores que também podem envolver violência sexual) ou em decorrência de violência doméstica.

A lei 13.104/15, mais conhecida como Lei do Feminicídio, alterou o Código Penal brasileiro, incluindo como qualificador do crime de homicídio o feminicídio.

Representação de agressão contra a mulher (Fonte: Internet – Ilustrativo).

A ONG Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) divulgou o dado que em 2017 foram registrados, aproximadamente, 1.100 casos de feminicídio. E, ao mesmo tempo, não é possível ter uma noção de quanto este número aumentou até hoje.

Normalmente, os crimes são realizados pelos autores com facão, foice, faca e arma de fogo, sem contar os casos de estupro, lesão corporal, agressões verbais, assédio moral, estrangulamento, assédio sexual e entre outros crimes.

E é no caminho de tentar conscientizar a população para o combate da violência contra a mulher, que o mês de agosto recebe a cor lilás para tratar sobre o tema em sociedade. Afinal, o Brasil é o país com o maior registro de crimes.

Símbolo do agosto Lilás (Fonte: Freepik).

Ao trazer a realidade para a cidade de Ourinhos, é perceptível que a Delegacia de Defesa da Mulher é um órgão público em bastante atividade, que busca o contato com a população e com a mídia local, então, o trabalho da delegacia possui uma solução de continuidade positiva em relação a outras cidades. Desta forma, ocorre uma estabilidade em número de ocorrências.

“Se for ver a média do ano, tem ano que tem menos que o anterior. Isso não significa que não haja busca, ela existe sim. Mas nós não fazemos milagres. A violência doméstica, enquanto sociedade vai existir porque nem todas as pessoas são iguais e nem todas sabem solucionar o problema da forma que deveria ser. Procuramos, na maioria das vezes, uma conciliação e não uma explosão”, explica a delegada de polícia doutora Ana Rute Bertolaso.

Segundo a delegada, os crimes principais são ameaças, ofensas morais (injúria, difamação e calúnia) e a lesão corporal, que se não acompanhados e não houver interrupção, podem levar ao homicídio.

A delegada afirma que se existe o registro de boletim da ocorrência, de alguma violência, não significa que o juiz será informado sobre o caso. Pois a legislação permite, em alguns crimes, que só a pessoa pode manifestar se ela quer ou não o procedimento. Se a vítima não quiser prosseguir com o processo, o próprio código já diz que depende de ela manifestar igual atitude em relação as ofensas morais que depende da defesa crime através de advogado.

O boletim é registrado em âmbito de violência doméstica, porque é diferente de um acidente de trânsito, por exemplo, que não seja doloso ou culposo. “Então, se houver lesão e for comprovada, já existe o procedimento e se ela quiser desistir tem que ser em juízo. É feito o inquérito, as pessoas são ouvidas, juntadas as provas, cabe a delegacia e a polícia judiciária comprovar o crime e a autoria, e o fórum é quem vai definir a punibilidade do autor”, diz a doutora Ana Rute.

Doutora Ana Rute de Castro Bertolaso delegada da Delegacia de Defesa da Mulher.

“Eu entendo que as vítimas ainda não têm consciência, é uma cultura nossa, do que elas podem realmente fazer. As vítimas têm que entender que você registrando a ocorrência não está resolvendo um problema familiar e, sim, um problema criminal. Mas existe uma parte cível que precisa ser resolvida”, conta a delegada.

Se for um caso de violência doméstica, precisa avaliar quais as medidas protetivas foram pedidas pela vítima, sem se esquecer dos direitos do autor, por exemplo, de ver seus filhos se for um pai.

As pessoas, perante qualquer criminalidade contra a mulher, não podem ter o sentimento de vingança, pois a lei irá protege-la da melhor maneira possível sem qualquer outro modo de agressividade. É preciso uma mudança comportamental, porque é um processo gradativo e com o único objetivo: proteger a mulher e ir em busca do combate ao crime.

Quando a vítima for uma criança ou adolescente existe uma legislação que diz que ela não precisa ser ouvida na delegacia, somente se for em caso de auto de prisão em flagrante, desta forma, a vítima passa por outros profissionais, como o psicólogo.

Já as mulheres adultas devem comparecer à delegacia e fazer a denúncia, porque se ela quiser o procedimento, é preciso registrar a história, embora só 12% dos casos de estupros sejam denunciados, afirma a delegada, baseada em uma estatística mundial.

Na opinião da profissional, para ajudar ao combate à violência contra a mulher, seria importante uma conscientização para a população, pois, por exemplo, um crime sexual na maioria das vezes é um desvio de conduta social, indicando que há uma doença que deve ser tratada.

Fachada da Delegacia de Defesa da Mulher em Ourinhos.

Casos de feminicídio envolvem a questão de gênero e, de acordo com as experiências da delegada Ana Rute,  “isso só vai dar o aumento de pena para o autor, mas nós estamos falando da mudança de cultura para a interrupção do ciclo de violência, nós caímos na mesma questão de regra para não ser violentada sexualmente na rua, ou seja, não existe regras. E não podemos acreditar que o outro não é capaz de fazer, agora como impedir a gente não consegue isso. Porque, geralmente, o feminicídio vem a ser praticado com uma violenta emoção que é uma qualificadora. Com emoção dizemos que a pessoa quer a outra em uma questão de posse e isso passa a ser problema de criminologia. Normalmente, depois o autor se arrepende, porque o crime é baseado em uma paixão e aí o caos já está feito”, conta.

Então, a lei do feminicídio veio de forma positiva para aumentar a proteção contra a mulher, pois o parceiro ou a parceira deve entender que o amor não justifica que o outro seja uma propriedade de alguém, muito menos não tem o direito de matar.

Por fim, o segredo para o combate é uma conscientização da sociedade em busca de uma mudança cultural, que é gradativa, não depende somente de um ou outro e sim da população como um todo.

Representação de crime contra a mulher (Fonte: Freepik).

Lembrando que ao falar de conscientização também estamos falando sobre educação que vem da própria casa e das escolas, por isso, se fala em mudança cultural. E o movimento feminista é positivo no sentido de contribuição para futuras mudanças, mas a conscientização em si não vem com imposições, é um processo lento.

“Os movimentos são necessários, mas entre necessidade e a solução tem uma separação imensa, são paralelas que em algum lugar vão se cruzar, e depende desta conscientização profunda”, fala a delegada.

A delegada ainda acrescenta que “temos que ter consciência em qualquer violência, seja doméstica ou não, que a gente não precisa ser vítima. Eu posso ser vítima, mas me mantenho na situação se eu quiser. A gente precisa ter uma condição digna de vida, de respeito, em incentivo, poder fazer o que eu quero respeitando a outra parte. O respeito deve ser recíproco na sociedade, é questão de equilíbrio. O que eu não gosto para mim, a outra parte também pode não gostar”, conclui Ana Rute.

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