sábado, 27 de julho de 2024

Mulher se disfarça de menina de 14 anos para revelar como os pedófilos atuam na internet

Publicado em 19 dez 2017 - 01:42:36

           

Por BBC

Qudsiyah Shah tem 20 anos, mas em alguns vídeos parece ter apenas 14. A ativista decidiu usar sua aparência de menina para investigar como os pedófilos atuam na internet e quais são os riscos a que crianças estão expostas quando estão na rede.

Após se passar por uma adolescente, ela conversou com a reportagem sobre a experiência, que classificou como “aterrorizante” e “nojento”.

Segundo Shah, os comentários que recebeu de alguns internautas chocariam até mesmo adultos. Ou seja: seriam totalmente impensáveis para crianças.

Ela analisou o cenário com a ajuda de um disfarce: um uniforme escolar. Sua estratégia envolveu postar vídeos em três dos mais populares aplicativos que permitem transmissões ao vivo: o Periscope, o Live.me e o Omegle.

Em poucos minutos, começou a receber comentários pedindo que tirasse a roupa.

Mensagens picantes – “Alguns desses internautas eram muito explícitos”, explica Shah. “Mostre seus seios”, “tire o sutiã”, escreviam por meio do Periscope, que tem mais de 10 milhões de usuários.

Ela contou que sua primeira sensação foi de confusão, por ser bombardeada por essas mensagens. “Minha primeira reação foi de confusão. No começo é agradável receber toda essa atenção e corações (que os usuários enviam quando gostam de um vídeo), mas tudo ficou obscuro muito rapidamente”, disse a ativista.

No Live.me – aplicativo lançado no ano passado por um desenvolvedor chinês e que vem crescendo rápido, ela recebeu várias mensagens picantes. Em alguns casos, a convidavam para ver, “se fosse madura”, conteúdo de meninos.

No Omegle, site especializado em videochat, Shah também recebeu comentários impróprios, apesar de usar a “seção moderada”, pensada para menores de 18 anos.

Logo após começar uma conversa, alguns homens se ofereceram para mostrar seus genitais.

O Omegle e o Live.me foram procurados pela BBC, mas não quiseram comentar o assunto. O Periscope respondeu: “Manter as pessoas seguras é nossa prioridade. Temos tolerância zero à exploração sexual infantil”.

‘Desagradáveis’ – A proliferação de ferramentas de transmissão ao vivo, entre as quais também se encontram Facebook, Instagram, YouTube e Snapchat, despertou o alerta sobre os riscos para crianças e adolescentes e a facilidade com que abusadores podem entrar em contato com suas potenciais vítimas.

Em alguns casos, a exposição de crianças a material obsceno é especialmente preocupante.

“Em um aplicativo de transmissão ao vivo, cuja idade média do usuário é de 17 anos, eu vi alguém pedir a uma garota de 9 anos para tirar sua roupa logo em seu primeiro vídeo”, disse Angus Crawford, repórter da BBC que passou nove meses investigando o problema.

“Também encontrei outra garota da mesma idade, cujo vídeo estava sendo assistido por cerca de mil pessoas. Os pedidos e comentários eram desagradáveis demais para dizer aqui”, acrescentou.

A BBC compartilhou suas descobertas com a polícia e com a Sociedade Nacional para Prevenção da Crueldade contra Crianças (NSPCC, na sigla em inglês), no Reino Unido.

“Também enviei uma lista de usuários que publicaram comentários ofensivos”, afirmou Crawford, “mas a maioria é de anônimos, provavelmente impossíveis de rastrear”.

Além disso, há os “presentes virtuais”, que podem ser trocados por dinheiro real e também representariam um risco a crianças e adolescentes, uma vez que sua regulação é complicada.

Pergunta difícil – “Para muitos pais, o mundo dos aplicativos de vídeos ao vivo é confuso. Todos os meses sai uma novidade, que se torna a última moda”, disse Crawford.

Essas ferramentas são muito fáceis de baixar e bastante fáceis de usar. A maioria permite aos jovens transmitirem suas imagens ao vivo para o mundo inteiro, e a partir de qualquer lugar: da sala de aula, do pátio da escola ou do próprio quarto.

“Algumas dessas plataformas restringem quem pode ver as transmissões em vídeo. A maioria delas é, no entanto, aberta para qualquer usuário do app, e isso inclui predadores sexuais”, explicou o jornalista.

“A maioria tem algum tipo de verificação de idade, mas a efetividade desse tipo de ferramenta varia. Basicamente, qualquer um que tem um telefone pode usar esses aplicativos.”

Outras plataformas oferecem a possibilidade de os próprios usuários denunciarem comportamentos suspeitos. “O problema é que se a maioria dos espectadores tiver más intenções – e eu testemunhei isso -, eles votam para o comentário continuar no ar”, afirmou Crawford.

É fácil ver por que as crianças gostam desses aplicativos, contou o jornalista: são imediatos, parecem divertidos. “E muitas delas idolatram os vloggers (videobloggers) e youtubers, que fazem o mesmo.”

“Enquanto o engajamento (quanto os usuários participam das redes sociais) seguir sendo a palavra mágica para as empresas, quanto mais vídeos houver numa plataforma, mais publicidade ela atrairá”, disse.

“Mas o crescimento desses aplicativos enseja uma pergunta séria para a indústria tecnológica: quando você cria um app que permite que crianças publiquem vídeos a partir de seus quartos, é realmente possível mantê-las a salvo?

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